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Ubirajara: Lenda Tupi

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Os cantores exaltaram a gloria dos dois chefes: a do velho Camacan, que trocára a arma do guerreiro pelo bordão do conselho; e a do joven Ubirajara, que na sua mocidade já se mostrava tão grande, como fôra o pai na robustez dos anos.

Pojucan teve o consolo de ouvir seu nome, repetido muitas vezes e louvado a par com o de seu vencedor.

Os cantores celebraram depois os grandes feitos da nação araguaia, desde os tempos remotos em que os projenitores deixaram a grande taba dos Tamoios, seus avós.

Quando os nhengaçáras entoaram o canto do triunfo, vieram as mulheres com vazos cheios do generozo cauim e aprezentaram as taças aos guerreiros.

Jandira suspirou; ella era virjem, e como suas companheiras, não podia aparecer na festa dos guerreiros.

Sentiu não ser já espoza, para ter o orgulho de encher de vinho espumante, por ella fabricado, a taça de seu heróe e senhor.

O guincho agoureiro da inhúma resoava na mata, quando começou a dansa guerreira que durou até perto da alvorada.

III
A NOIVA

Ao raiar da luz no céu, Jandira abriu os lindos olhos negros.

Seu canto foi o primeiro que saudou o nacer do dia e acordou em seu ninho a viuvinha.

A doce filha de Majé saltou da rêde que embalára os sonhos castos da virjem, e despediu-se della como a jaçanan que deixa a moita para habitar o ninho do amor.

A virjem tocantim acreditava ter dormido a ultima noite na cabana paterna, que essa manhã ia trocar pela cabana do espozo.

O joven caçador que a amava, Jaguarê, fôra aclamado guerreiro, e entre todos os guerreiros o chefe da nação.

Como guerreiro elle póde tomar uma espoza; e como chefe pertence-lhe a virjem de sua escolha, entre as mais formozas da taba.

Ainda que a virjem tenha um noivo, ou que o pai a destine a outro, se o chefe a dezeja, a vontade de Tupan é que lhe pertença.

Tupan assim ordena para que os grandes chefes possam gerar de seu sangue os mais belos e valentes guerreiros.

Jaguarê antes de ser aclamado chefe já a tinha escolhido, e Jandira não aceitaria outro noivo senão o joven caçador a quem amava.

Ella o espera. Logo que o sol alumie a terra, Ubirajara, o grande chefe, ha de vir buscal-a.

Então a virjem se despedirá de Majé; e irá armar na cabana de seu guerreiro e senhor a rêde da espoza.

Lijeira e contente corre a banhar-se no rio antes que chegue Ubirajara, para quem purifica seu corpo e se unje com o oleo fragrante do sassafraz.

Ella quer que o destemido guerreiro ache seu amor saborozo como o vinho que espumá na taça, e ferve nas veias.

Tornando á cabana, perfumou de beijoim a larga rêde que tecera dos fios do algodão entrelaçados com as penas do guará.

Essa rêde tinha duas vezes o tamanho de sua rêde de virjem, porque era a rêde do cazamento em que devia receber o espozo.

Depois arrumou no urú a louça que havia fabricado para o serviço do guerreiro, e que devia transportar á sua nova cabana.

Quando terminou todos os preparativos, encostou-se á porta da cabana; seus olhos impacientes chamavam Ubirajara.

Mas o guerreiro não vinha, e o sol já tinha subido além da crista da serra.

A luz do dia derramava a alegria pelos campos; e a alegria que lhe afagára os sonhos da noite fujia agora da alma de Jandira.

Então a filha de Majé partiu em busca do noivo que a esquecera.

No mais escuro da mata vaga o chefe dos araguaias.

Seus olhos fojem á luz do dia e buscam a sombra, onde encontram a imajem que traz na lembrança.

Á noite quando o guerreiro dormia em sua rêde solitaria, Arací, a linda virjem, lhe apareceu em sonho e lhe falou:

– Jaguarê, joven caçador, tu dormes descansado emquanto os guerreiros tocantins se preparam para roubar a virjem de teus amores. Ergue-te e parte, se não queres chegar tarde.

Elle erguera-se para seguil-a; mas a virjem formoza desferiu a corrida veloz através da campina e dezapareceu na floresta.

Neste ponto do sonho o guerreiro acordára.

Uma estrela brilhante listrava o céu, como uma lagrima de fogo, e Ubirajara pensou que era o rasto de Arací, a filha da luz.

A jurití arrolhou docemente na mata e Ubirajara lembrou-se da voz mavioza da virjem do sol.

O guerreiro tornou á rêde, esperando achar ali outra vez o sonho que vizitára sua alma; porém o sono fujira de seus olhos.

Quando raiou a primeira alvorada, Ubirajara saiu da cabana e buscou no mais espesso da mata a sombra propicia á saudade.

Seu passo o guiava sem querer para as bandas do grande rio, onde devia ficar a taba dos tocantins.

É assim que os coqueiros, imoveis na praia, inclinam para o nacente seu verde cocar.

Ubirajara ouviu o rumor de um passo lijeiro através da mata; de lonje conheceu Jandira que o procurava.

A doce virjem achára á porta da cabana o rasto do guerreiro e o seguira através da floresta.

– Que máu sonho aflige Ubirajara, o senhor da lança e o maior dos guerreiros, chefe da grande nação araguaia, para que elle se afaste de sua taba e esqueça a noiva que o espera.

– A tristeza entrou no coração de Ubirajara, que não sabe mais dizer-te palavras de alegria, linda virjem.

– A tristeza é amarga; quando entra no coração do guerreiro, o enche de fel. Mas Jandira fará como sua irmã, a abelha, ella fabricará em seus labios os favos mais doces para seu guerreiro; suas palavras serão os fios de mel que ella derramará na alma do espozo.

– Filha de Majé, doce virjem, ainda não chegou o dia em que Ubirajara escolha uma espoza; nem elle sabe ainda qual o seio que Tupan destinou para gerar o primeiro filho do grande chefe dos araguaias.

O labio de Jandira emudeceu; mas o peito soluçou.

A virjem conheceu que o amor de Ubirajara retirava-se della, e que de todo o perderia se o não defendesse.

Então escondeu a dôr no fundo da alma e chamou o rizo a seus labios, a alegria a seus olhos.

Ella sabia que os guerreiros amam a flôr da formozura, como a folhajem da arvore; e que a tristeza murcha a graça da mais linda virjem.

– Chefe dos araguaias, Ubirajara, não desprezes Jandira que outr'ora escolheste para tua noiva. Se então ella era formoza a teus olhos, mais formoza se fará para merecer teu amor. Tu gostavas de seus cabelos negros que arrastam no chão; ella os entrançará com as plumas vermelhas do guará para que te pareçam mais bonitos. Seus olhos negros que te falavam, ella os cercará de uma listra amarela como os olhos da jaçanan. Sua boca, que ainda não provaste, Jandira a encherá de amor para que bebas nella o contentamento.

Jandira esperou a palavra de Ubirajara; mas os labios mudos do guerreiro não se abriram.

– Teu amor, Ubirajara, ficará em meu seio como a flôr no vale. Jandira te dará muitos filhos e todos dignos de teu valor. Nestes peitos, que te pertencem, ella os nutrirá com seu sangue, não menos guerreiro do que o teu; porque é o sangue de Majé, o maior dos anciãos, depois de Camacan. Seus braços que outr'ora querias para tua cintura, não servirão unicamente para te abraçarem, mas tambem para te servirem. Tua espoza te acompanhará por toda a parte, na taba, como no campo do combate; ella cuidará de tua cabana; aprontará as mais saborozas iguarias para seu guerreiro, e fabricará para elle o vinho, que é a alma da festa.

– Jandira é a mais bela das virjens araguaias. Seu amor fará a ventura de um guerreiro valente. Ubirajara não podia achar para si uma espoza mais fiel, nem para seus filhos outra mãi tão fecunda. Mas a noite deceu em sua alma. Só a estrela do dia póde restituir-lhe a alegria que o abandonou. A filha de Majé merece um guerreiro que tenha olhos para a sua formozura.

Pojucan sentou-se pensativo á porta da cabana.

O semblante, sempre grave, como convém a um chefe, cobre-se de tristeza.

A noite que foje da terra, vencida pelo sol, parece recolher-se na alma do chefe tocantim.

Não é sua ferida que o faz sofrer. O balsamo suave da embaiba sára rapidamente os golpes mais profundos; e os varões tocantins aprendem desde o berço a desprezar a dôr.

É em seu coração de guerreiro, que Pojucan sente as garras do Anhanga.

O revez de ser vencido e cair prizioneiro, elle o suporta como o varão forte que viu prostrados por Aresqui no campo da batalha os mais terriveis guerreiros.

A grandeza do vencedor o consola; resta-lhe ainda a gloria de ter rezistido a um braço, como o de Ubirajara, grande chefe dos araguaias.

Mas elle esperava que depois de haver ornado com sua prezença a festa do triunfo, o vencedor fosse generozo, e lhe concedesse a honra do sacrificio.

É o temor de que Ubirajara lhe recuze uma morte glorioza e o retenha cativo, que nesse momento acabrunha o chefe dos tocantins.

Elle, um guerreiro livre que pizára outr'ora como senhor aquelles campos, reduzido á condição de escravo?

Elle, um varão chefe que tinha na obediencia de seu arco mais de mil guerreiros valentes, obrigado a reconhecer um dono?

Elle, que afrontava a cólera de Tupan, quando o deus irado rujia do céu, curvar-se ao aceno de um homem, fosse embora o mais pujante dos filhos da terra?

Pojucan estremecia quando se lembrava que podia ser condenado a tão grande humilhação.

Em seu terror promovia o passo, com o impeto de fujir para sempre da taba dos araguaias, onde o ameaçava aquella vergonha.

Mas uma força invencivel atava-lhe a vontade. Elle não se pertencia desde o momento em que Ubirajara lhe calcou a mão direita no hombro.

Esse era o sinal da conquista, que prendia o vencido ao vencedor; aquelle que violasse a lei da guerra, perderia para sempre o nobre titulo de guerreiro.

O desprezo do inimigo o acompanharia aos seus campos nativos; e a taba de seus irmãos não se abriria para o fujitivo que houvesse dezhonrado o nome de sua nação.

Por isso na cabana solitaria, Pojucan está mais guardado do que se o cercasse a multidão dos guerreiros araguaias.

 

Véla elle proprio em si, porque véla em sua fama.

Póde Ubirajara esquecel-o, que na volta o encontrará ali onde o deixou.

Nada o arrancará da cabana; nem a necessidade de buscar o alimento para o corpo.

Bem vinda será a fome, se durar tanto que prostre seu corpo robusto, e o entregue ao seio da terra, onde o guerreiro dorme o sono da gloria.

Além rompe da selva Ubirajara, que se encaminha para a cabana com o passo rapido.

Segue-o de perto Jandira, como a gentil corça acompanha o caçador, que lhe roubou o companheiro.

Descobrindo o chefe dos araguaias, Pojucan encerrou a tristeza dentro de sua alma; e chamou ao rosto a altivez dos grandes guerreiros.

O chefe tocantim não queria que seu vencedor se regozijasse de ter-lhe abatido o animo inflexivel.

Quando Ubirajara se aproximou da cabana, Pojucan tomou-lhe o passo.

– Ubirajara, senhor da lança, grande chefe da nação araguaia, não confessaste tu diante dos anciãos das tabas e de todos os teus guerreiros, que Pojucan era o varão mais forte e o mais terrivel no combate, que o sol tinha visto até o momento de ser vencido por ti?

– Ubirajara o disse. É a voz da nação araguaia.

– Desde que tu cruzaste comigo a seta do dezafio até este momento, Pojucan, guerreiro varão, e chefe de uma taba, na valente nação dos tocantins, mostrou-se pela sua constancia e valor digno do sangue de seus avós?

– Pojucan o disse; e a fama o repete.

– Então porque Ubirajara, o grande chefe dos araguaias, não concede a Pojucan a morte glorioza, que os tocantins jámais recuzaram a um guerreiro valente, e que sómente se nega aos fracos? Já não serviu Pojucan á tua gloria na festa do triunfo? Esperas delle que te obedeça como um escravo? Se aviltas o varão, a quem venceste, humilhas o teu valor que elle exaltava.

O grande chefe araguaia ouviu sem interromper o prizioneiro, e respondeu com gravidade:

– Ubirajara não recuza ao bravo chefe tocantim, seu terrivel inimigo, o suplicio, que não negaria a qualquer guerreiro valente. Elle esperava que tua ferida se fechasse de todo, para que o grande Pojucan possa no dia do ultimo combate sustentar a fama de seu nome, e a gloria de um varão que só foi vencido por Ubirajara.

O grande chefe dos araguaias levou aos labios a inubia de Camacan; a voz do mando reboou pelo vasto ambito da taba.

Apareceram vinte jovens guerreiros, a quem elle ordenou que chamassem a conselho os anciãos.

Depois tornou ao chefe tocantim:

– Os araguaias receberam de seus avós o costume das nações que Tupan creou. Elles destinam ao prizioneiro a mais bela e a mais ilustre de todas as virjens da taba, para que ella conserve o sangue generozo do heróe inimigo e aumente a nobreza e o valor de sua nação.

– É esta tambem a lei, que os guerreiros tocantins observam em suas tabas.

– A mais bela e a mais nobre de todas as virjens araguaias, aquella que se ergue como a palmeira no meio da campina coberta de flôres, é Jandira, a filha de Majé, que tem no seio os doces favos da abelha.

Travando então do pulso de Jandira, que ali ficára preza de sua vista, levou-a ao prizioneiro.

– Recebe-a como espoza do tumulo.

Jandira que ouviu espavorida aquellas palavras, quiz fujir; porém a mão do chefe araguaia a reteve.

– Ubirajara parte, mas elle voltará para assistir a teu suplicio e vibrar-te o ultimo golpe. Pojucan terá a gloria de morrer pela mão do mais valente guerreiro.

Ficaram Jandira e Pojucan em face um do outro.

– Virjem dos araguaias, Tupan te rezervou para espoza do mais terrivel dos inimigos de tua nação. O filho de seu sangue será o mais valente dos guerreiros; tu sentirás orgulho por havel-o gerado em teu seio.

– Pojucan, chefe tocantim, Jandira nunca será tua espoza.

– Não é Ubirajara o chefe de tua nação, e não te destinou elle para servir de noiva do tumulo ao guerreiro que vai morrer no suplicio?

– Ubirajara é o grande chefe da nação araguaia; á sua voz cala-se a palavra dos anciãos; a seu gesto curva-se a fronte dos guerreiros; á sua vontade obedecem as tabas. Mas no amor de Jandira, ninguem manda, nem Tupan. Jandira é noiva de Ubirajara, e se elle não quizer aceital-a, o guanumbí a levará para os campos alegres onde repouzam as virjens que morreram.

– Pojucan não carece do amor de Jandira. Nas tabas dos tocantins a mais bela das virjens se regozijaria de pertencer ao mais valente dos chefes, e de habitar sua rêde. Nas tabas dos araguaias, onde nacem guerreiros como Ubirajara, não faltarão virjens formozas, que dezejem a gloria de ser mãi de um filho de Pojucan.

– Jandira seria a primeira, se não conhecesse Jaguarê, o mais belo dos jovens caçadores, que é hoje Ubirajara, o senhor da lança e chefe dos chefes. Pojucan merece uma espoza que nunca tenha ouvido o canto de outro guerreiro, para dar-lhe um filho digno delle.

– Os ritos de tua nação não punem a noiva que rejeita o prizioneiro?

– Jandira sabe que se sujeita á morte; mas a morte é menos cruel do que o abandono.

– Então foje, virjem dos araguaias, e esconde-te á cólera dos anciãos. Talvez mais tarde Ubirajara se arrependa e te perdôe.

– Jandira parte. Ella te dezeja uma espoza terna e a morte glorioza.

A filha de Majé penetrou na floresta, e afastou-se rapidamente da taba.

Quando já estava muito lonje, sentou-se á sombra de um manacá coberto de flôres e cantou:

– Eu fui Jandira, a linda abelha, que fabricava os favos de cêra para enchel-os de mel saborozo.

«Agora arrancaram-me as minhas azas com que eu voava pela campina colhendo o pó das flôres; e secou a doçura de meu sorrizo.

«O canto que saía de meu seio era como o da patativa ao pôr do sol, quando se recolhe em seu ninho de paina macia.

«Agora eu queria ter no coração uma serpente para morder aquella que me roubou o amor de meu guerreiro.

«Guardei a minha formozura para orgulho do espozo, e inveja dos outros guerreiros.

«Agora eu trocaria a flôr do meu rosto por um aspeto terrivel que infundisse pavor.

«Meus seios mais lindos que os botões do cardo por um peito feroz, e as mãos lijeiras que tecem os fios do algodão pelas garras do jaguar.

«Eu fui Jandira, o manacá viçozo que se vestia de flôres azues e brancas.

«Agora sou como a jussara que perdeu a folha, e só tem espinhos para ferir aquelles que se chegam.»

Os anciãos já estavam reunidos na oca do conselho, quando Ubirajara entrou.

Falou Camacan:

– Ubirajara, senhor da lança, chefe dos chefes, os pais da grande nação araguaia escutam a tua voz.

O grande chefe tres vezes bateu no chão com a ponta do arco e disse:

– Pojucan, o chefe tocantim, pede a morte do combate; elle a merece, porque é um grande guerreiro e um varão ilustre. Ubirajara concedeu-lhe essa honra, como seu vencedor.

– Ubirajara é um inimigo generozo; respondeu Camacan.

Todos os anciãos inclinaram gravemente a cabeça encanecida para exprimirem sua aprovação ás palavras de Camacan.

Proseguiu Ubirajara:

– É tempo de escolher para o prizioneiro uma espoza digna de acompanhar em seus ultimos dias ao heróe inimigo, e de ser mãi do marabá, o filho da guerra.

Todos os abarés dezejavam para si a gloria de oferecer uma filha ao prizioneiro.

– Ubirajara destinou-lhe Jandira, filha de Majé. Ella o merece por sua formozura, e pelo sangue do grande guerreiro que gira em suas veias.

– Ubirajara é um grande chefe, disse Camacan.

Os anciãos aprovaram outra vez com a cabeça; Majé acrecentou:

– O sangue do velho Majé não desmentirá em Jandira a fama da nação araguaia.

– Não! disse Ubirajara e todos os anciãos repetiram: Não!

O grande chefe tornou com a voz pauzada:

– Celebrai a ceremonia da entrega da espoza ao prizioneiro. Ubirajara parte; só estará de volta na proxima lua para assistir ao suplicio de Pojucan. Se na auzencia de Ubirajara cair na taba a flecha, nuncia da guerra, conduzi o trocano ao sitio onde se abraçam os grandes rios, e soltai a voz da nação araguaia. Nesse dia Ubirajara será comvosco.

Os prudentes anciãos, com a cabeça inclinada para melhor ouvir, recebiam as palavras do grande chefe e as guardavam na memoria.

Quando Ubirajara se calou, Camacan repetiu, ainda mais pauzado, as recomendações do filho:

– É esta a vontade de Ubirajara?

– Tu o disseste.

– Os anciãos guardaram a palavra do chefe dos chefes? perguntou ainda Camacan.

– Ella entrou no espirito dos abarés, como a raiz no seio da terra, observou Majé.

– Bem dito, repetiram todos.

Ubirajara saiu do carbeto; após elle os anciãos se retiraram lentamente.